Abragão? Onde é isso? dirão alguns.
O mesmo pensei quando o casal amigo António Ferreira e Beatriz Máximo me
convidaram a participar no passeio que eles têm organizado há vários anos.
O simpático casal organizador do passeio |
Sorte a minha tê-los conhecido, ter
uma moto que se enquadra no âmbito das clássicas (pese embora os possuidores
das BMW e de outras europeias me olhem com alguma indiferença disfarçadaJ) e o ter aceite lá ir pela primeira
vez.
Se calhar ainda não disse, mas tenho
duas nipónicas clássicas - duas Honda CX500 de 78 e 81 (ver http://hondacx500portugues.blogspot.pt/)
que me fizeram ver a estrada de outra forma, mais pausada, mais contemplativa e
relaxada.
As concentrações de clássicas são um
mundo à parte no mundo das motos. Nela convergem pessoas socialmente sãs e o
melhor de tudo é que trazem às suas costas uma bagagem cultural infindável
sobre uma vida passada e uma paixão: as motos antigas.
Não consigo dizê-lo de outra forma, é
o sentimento nobre que me invade quando vejo os seus orgulhosos donos montados
em motos cheias de carisma, autênticas obras de arte rolante. Nada que ver com
aquelas concentrações de barulhentos motoqueiros sebosos, sedentos de cerveja e
de excitações baratas prontas a servir e que de motos só sabem daquela que os
trouxe até ali, e alguns nem isso!
Abragão é uma pequena vila situada a
sul de Penafiel e a oeste de Marco de Canavezes, virada para o leito do rio
Tâmega. Por ela passa a rota do românico, uma estrada que serpenteia por aquela
região e nos leva aos lugares mais recônditos, mas também nos mostra o majestoso
Douro e o seu afluente, o Tâmega.
Este foi o segundo ano em que
participei e tanto num como no outro só estive presente num dos dois dias.
Problemas de âmbito logístico L. Em ambas ocasiões os organizadores
foram peremptórios: Não há atrasos e a saída é às 09h00!!! Apoiado!
Na recta da Tabopan, Vila Pouca de Aguiar |
Saí de Chaves bem cedinho pela
nacional, claro. O tempo sentia-se fresco, mas estava de maravilha, um sol
brilhante que incitava a passear. Porém ao passar o Marão o tempo mudou de cara.
Todo o vale desde Amarante até se calhar ao Porto, estava coberto com um
espesso manto de nevoeiro que gerava um orvalho pesado pondo em dúvida se
estaria a chover. Mesmo assim só cheguei às 09h15, é verdade, atrasado, mas tive
a desculpa de vir de (relativamente) longe.
Cumprimentos feitos, foi só
reabastecer e toca a sair. É assim mesmo!
Rumamos para Marco de Canavezes pela N320
e N210 e dali continuamos até Baião e Santa Marinha do Zêzere, que nada tem a
ver com o nome do rio, bem pelo contrário está bem debruçada, sem se ver, para
o rio Douro, onde paramos num agradável parque relvado de traço moderno. Nessa
altura já estávamos a receber os benefícios do bendito astro-rei que tanta
alegria nos dá nem que seja só pelo brilho que dá à paisagem!
Já tínhamos andado por essa altura
cerca de 60 Km, nada mau para as velhinhas glórias. Pensava que a paragem era
só para esticar as pernas e verter águas (eheh) mas num instante montaram um
pequeno lanche com salpicão, bola de carne e um bolo de "não-sei-o-quê"
que soube de maravilha.
Algures na serra do Montemuro |
Prontinhos e aconchegados, arrancamos e
descemos até ao rio e voltamos a subir até Resende. A partir de ali a vegetação
alta e verdejante transformou-se em erva e arbustos rasteiros, o que sobrou de
sucessivos e crónicos incêndios. Tínhamos entrado no temeroso e austero maciço
da serra do Montemuro!
Ponte e torre medieval em Ucanha |
Chegados a Bigorne atravessamos a N2 e
dirigimo-nos até Tarouca, passando pelas isoladas e frias aldeias de montanha,
Lazarim e Lalim. Dali fomos até Ucanha onde fizemos um breve alto para ver a
torre e a ponte medieval. Segundo os entendidos foi ali que se iniciou o mau
hábito de cobrar portagens nas pontes e infelizmente estendeu-se para muitas
mais coisas.
As motos estacionadas em frente do museu do espumante Murganheira |
Já estava a aproximar-se o almoço. Já tínhamos
mais de 100 Km percorridos, mas ainda deu tempo para ir ao museu do espumante
Murganheira, que com tantas voltas nem fiquei a saber bem onde fica aquilo. Ali
visitamos o palacete, que segundo a guia era antigo até dizer basta (eheh,
estava distraído quando falou), cujas salas estavam decoradas e preenchidas com
motivos relacionados com o champanhe e no final provamos o famoso e bem adamado
néctar.
De regresso a Tarouca, almoçamos no
restaurante Tio Pedro onde comemos uma refeição ao gosto de todos (carne
assada), feita por uma cozinheira que se revelou no final uma fã das motos,
tendo tirado uma carrada de fotografias connosco. O almoço tinha sido tão bom e
o ambiente tão familiar que quase me ía esquecendo de pagar!
Esta obra da engenharia é uma Nimbus 750 Luxus de 1938 |
Éramos 22 motos e quase o dobro de
participantes, pois a maioria levava acompanhante - uma particularidade comum
nestes passeios, a companheira costuma participar porque a coitada também ficou
contagiada pelo vírus das motos antigas :-).
Uma Zundap com uma configuração de motor parecido às BMW |
Estava calor, calculo que cerca de 30
graus naquele local abrigado com reflexos do sol. O pessoal não resistiu. Descascou-se
e muitos não tiveram problemas inclusive em por os braços ao léu. Voltamos a
subir em direcção à montanha. Agora vão entender porque chamei temeroso à serra
do Montemuro. Começamos a ver uma línguas de nuvens alongadas ao longo da
montanha e entramos nelas… foi como se passássemos do Brasil para a Antártida!
O pessoal enregelou instantaneamente e da mesma forma parou para voltar a
vestir aquilo que tirou. É que não dava para aguentar!
BMW R69 S |
Depois disso voltamos a percorrer por
outros caminhos a "dita-cuja-serra-cujo-nome-não-devemos-pronunciar"
sob pena de desaparecermos nas suas entranhas, mas aquilo já não era o que foi:
ficou tudo enevoado e estava uma brisa que até metia dó! O tempo tinha mudado.
Descidos até Cinfães, atravessamos a
barragem do Carrapatelo e lá fomos nós de regresso ao ponto de partida,
Abragão.
O evento ainda mal estava a meio.
Seguia-se o jantar e depois todo o dia seguinte com outro passeio, mas sobre
isso já não falo porque não estive presente.
Outra BMW algo modificada, mas muito bem acabada! |
Eram 19h00. Sem grandes delongas
despedi-me e voltei a abastecer para meter-me à estrada até Chaves. Desta vez e
não sei bem porquê dei mais gás e a minha menina japonesa reagiu bem, com
alegria, com o espirito desportivo com que foi construída. Andamos juntos
naquele dia cerca de 500 Km e nem ela nem eu acusamos o esforço.
Para o ano quero participar nos dois dias,
mas o organizador, o Ferreira, já me disse que talvez não haja mais. mas eu
prefiro pensar que quando o disse, estava com a disposição da cabra que está a
parir e grita - "nunca mais! nunca mais!", mas mais tarde, quando vê
os seus belos e ternurentos cabritinhos olha e diz carinhosamente
"veremos, veremos".
Assina, o cabritinho reconhecido.
Parabéns!
Uma Honda CB450 dos anos 60 |
Pormenores da Zundap, com linhas arredondadas e bem terminadas |
Não resisti gravar em vídeo o motor da Nimbus a trabalhar, um 4 cilindros em linha longitudinal, onde os balancetes, estando inusualmente à vista, sobem e descem num frenesim incessante: